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Claudio Souza

by Claudio Souza DJ, Bloqueiro
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“Re­jei­ta­do pe­la mãe e pe­lo pa­dras­to, fugido da casa paterna para não morrer sob espancamento, porque eram espancamentos seguidos de espncamentos, Clau­dius fez das ru­as seu no­vo lar. En­tre o frio, a fo­me e o aban­do­no, ama­du­re­ceu ra­pi­da­men­te. Co­nhe­ceu de per­to o in­fer­no e, de­pois, o céu. Foi pe­las mãos de Fáti­ma que ele saiu da la­ma. Ga­nhou al­gu­mas rou­pas, um par de sa­pa­tos, um te­to e, o prin­ci­pal, um em­pre­go. En­quan­to cres­cia no tra­ba­lho, ia des­con­tan­do o tem­po per­di­do. Pa­ra Clau­dius, a Aids era um pro­ble­ma ‘dos ou­tros’, ja­mais acon­te­ce­ria com ele. Dos 18 aos 30 anos, ‘cor­reu atrás do pre­juízo’; to­do dia saía com uma ga­ro­ta. Quan­to à Aids, ‘se pe­gar, pe­gou’, cos­tu­ma­va di­zer. Pe­gou… Per­deu o em­pre­go, a ca­sa, os ami­gos… Mas le­van­tou a ca­beça e re­des­co­briu a dig­ni­da­de e o va­lor da vi­da, depois de se tornar um soropositivo…”

Cláudio Souza

Este sou eu, com cinco anos de idade

A fo­to é de 1969, quan­do eu ti­nha cin­co anos. Não sei por quê, mas te­nho a im­pressão de que o olhar da­que­la cri­ança, que em verdade era eu, já podia, de al­gu­ma for­ma, en­xer­gar, no ho­ri­zon­te, a imen­sa tem­pes­ta­de que se ele­va­ria sobre­bre si, algum dia…

Mi­nha história é, pen­so eu, mui­to co­mum. O fa­to é que co­nheço al­gu­mas pes­so­as que pas­sa­ram pe­lo mes­mo ca­mi­nho e estão por aí, to­can­do a vi­da. Saí de ca­sa ain­da cri­ança, com do­ze anos, não su­por­tan­do a vi­olência de meu pai; fui pro­cu­rar mi­nha mãe, que fu­gi­ra de ca­sa dois anos an­tes, atrás de uma aven­tu­ra, algo menos sofrido do que a vida com o marido que ela foi levada a se casar para não ser devolvida a um orfanato, numa história sórdida que começa com um “homem” deixado à espera da noiva… no altar… (ela deve ter tido, pelo menos, uma premonição, talvez a visão de um espírito que a amava e tomou a decisão certa e evadiu-se do casamento, para alcançar, quem sabe, uma eventual possibilidade de felicidade numa época em que o casamento era quase um contrato draconiano de adesão à uma vida em que seria sempre a figura inferior, indigna de atenção, merecimento e, o voto, era sempre igual ao do marido). Pa­re­ceu-me na­tu­ral buscá-la, seu refúgio, seu co­lo, seu ca­ri­nho, seu am­pa­ro… Mas me lem­bro bem de o meu possível pa­dras­to (car­ras­co) ter di­to a ela que não acei­ta­ria, na ca­sa de­le, o fi­lho de fi­lho da puta ne­nhum… Mi­nha mãe, sem­pre tíbia no caráter, acei­tou is­so com a sub­missão que sem­pre lhe foi própria quan­do al­go lhe era con­ve­ni­en­te e me en­ca­mi­nhou pa­ra as ru­as, on­de vi­vi cin­co anos, en­tre o frio, a fo­me, a cri­mi­na­li­da­de, a dis­cri­mi­nação, o abu­so de to­da or­dem…

“É pre­ci­so amar as pes­so­as co­mo se não hou­ves­se ama­nhã.”
Re­na­to Rus­so

Não vou nar­rar ca­da in­ver­no, ca­da dia e ca­da ho­ra; ca­da um ima­gi­ne por si só o que é a vi­da nas ru­as.

Mas, as­se­gu­ro-lhes que nin­guém sai de­las sem a aju­da de ou­tro al­guém. Nin­guém es­ca­pa do in­fer­no so­zi­nho, sem aju­da. Você po­de até so­bre­vi­ver in­de­fi­ni­da­men­te no in­fer­no, so­zi­nho, mas, pa­ra sair de lá, pre­ci­sará, sem dúvi­da, de aju­da. É um círcu­lo vi­ci­o­so em que você não con­se­gue as coi­sas que pre­ci­sa por­que não as têm. Não tem ca­sa por­que não tem tra­ba­lho; não tem tra­ba­lho por­que não to­ma ba­nho; não to­ma ba­nho por­que não tem ca­sa e as­sim vai, co­mo num mo­to-perpétuo.

Mas pa­ra mim hou­ve es­te al­guém. O meu al­guém, o meu an­jo, foi uma mu­lher. Des­tas que a ausência de sa­be­do­ria po­pu­lar cha­ma de “mu­lher da vi­da” ou “mu­lher de vi­da fácil” (vá lá vi­ver es­ta vi­da e você sa­berá o quan­to ela é fácil).

Não foi uma frei­ra nem uma da­ma da so­ci­e­da­de be­ne­fi­cen­te, nem uma se­nho­ra da li­ga espíri­ta ou es­po­sa de um pas­tor evangéli­co.

Foi uma pros­ti­tu­ta.

Es­se rótu­lo dei­xo por con­ta de vocês que lêem e dis­cri­mi­nam. Eu mes­mo a cha­mo de an­jo.

Deu-me um lu­gar pa­ra dor­mir, pa­ra to­mar ba­nho, du­as calças, três ca­mi­sas e um par de sa­pa­tos aper­ta­dos (nun­ca es­que­ce­rei o aper­to da­que­les sa­pa­tos e da ale­gria com que eu os calçava) que com­prou em uma lo­ja de usa­dos. E o prin­ci­pal: ar­ran­jou-me um em­pre­go de la­va­dor de pra­tos em uma bo­a­te em São Pau­lo — o Lou­vre — que já fe­chou há, pe­lo me­nos, dez anos.

Era po­bre — a vi­da foi cru­el com ela — a mi­nha Fáti­ma. Al­guém, por uma razão qual­quer, quei­mou seu ros­to com áci­do. Di­zem que por vin­gança.

Não sei que ti­po de áci­do, nun­ca me im­por­tei em sa­ber qual o mo­ti­vo. Sei que o es­tra­go foi gran­de, e uma pes­soa que vi­ve de ven­der seus fa­vo­res pre­ci­sa ser be­la, tem que ser atra­en­te. Uma man­cha ne­gra, co­brin­do 50% de seu ros­to e par­te de um dos sei­os não aju­da­va mui­to e tu­do era mui­to difícil pa­ra ela. Fáti­ma en­fren­ta­va di­fi­cul­da­des, até mes­mo uma epi­lep­sia que, se­gun­do ela, era con­seqüência do ata­que que so­freu. E en­fren­ta­va mui­tas hu­mi­lhações, de cli­en­tes e de co­le­gas de ser­viço.

Is­so tu­do não ser­viu de obstácu­lo a ela. Fez o que pôde e, cer­ta­men­te, o que não pôde pa­ra me re­er­guer ao pa­ta­mar míni­mo de dig­ni­da­de hu­ma­na.

Es­se an­jo en­trou e saiu de mi­nha vi­da co­mo um raio. Três ou qua­tro me­ses. Su­miu sem di­zer adeus e sem me dar a opor­tu­ni­da­de de lhe agra­de­cer. Dei­xou a no­ta da la­van­de­ria pa­ga e um mês de diári­as pa­gas num de­ter­mi­na­do ho­te­le­co na bo­ca do li­xo. Agra­deço-lhe aqui e fi­co na es­pe­rança de que me leia, de que se lem­bre e sai­ba que lhe sou gra­to, que nun­ca a es­que­ci e que nun­ca a es­que­ce­rei, nem po­de­ria. Nem mes­mo sei se seu no­me era Fáti­ma re­al­men­te ou se era um no­me fictício. Is­so sem­pre tor­nou mi­nhas bus­cas por ela mui­to difíceis e sem re­sul­ta­dos tangíveis. Nun­ca mais a vi.

Des­de então me per­gun­to quem ti­nha si­do re­al­men­te mi­nha mãe: aque­la em cu­jo úte­ro ha­bi­tei e cu­jo lei­te to­mei ou aque­la ou­tra (…) que a so­ci­e­da­de re­ne­gou e ro­tu­lou co­mo quis, de­pois de usar co­mo bem en­ten­deu…

Nun­ca pu­de che­gar a uma con­clusão de­fi­ni­ti­va so­bre is­so. Mas não im­por­ta. In­te­res­sa o que ela fez.

O fa­to é que, de­pois de ter re­cu­pe­ra­do a dig­ni­da­de, re­cu­pe­rei também a cons­ciência. E is­so me fez pen­sar. Pen­san­do, odi­ei mi­nha mãe com to­das as forças de meu ser. Às al­mas mais sensíveis que se cho­quem com es­sa de­cla­ração, eu ofe­reço meus cin­co anos de es­cu­ridão, me­do, frio e fo­me co­mo parâme­tro de ra­ci­ocínio. Tal­vez de­va bas­tar. Se não for su­fi­ci­en­te, ofe­reço os so­cos e pon­tapés que tro­quei, mui­tas ve­zes, pa­ra ga­ran­tir um san­duíche.

O ódio é um sen­ti­men­to co­mo qual­quer ou­tro e, pa­ra ser ex­tin­to, re­quer tem­po ou al­go que o com­pen­se.

Mui­tos anos se pas­sa­ram as­sim, sem que eu me pre­o­cu­pas­se em sa­ber se ela, mi­nha mãe bi­ológi­ca, vi­via ou não, se es­ta­va bem ou mal, pou­co me im­por­ta­va o des­ti­no de­la. Era uma questão de re­ci­pro­ci­da­de: a in­di­fe­rença de­la pe­la mi­nha.

Pa­re­ce-me jus­to. Justíssi­mo.

Mas es­sa mes­ma in­di­fe­rença foi se­pul­tan­do o ódio e a mágoa, a dor, o me­do, a angústia de me sa­ber sem mãe, sem ori­gens.

Na bo­a­te, não de­mo­rou mui­to até que fi­zes­se ami­gos e ami­gas. Em um ano, eu era o so­no­plas­ta da ca­sa. Na ver­da­de, o aju­dan­te do so­no­plas­ta (é o que cha­mam ho­je de DJ). Mui­tas na­mo­ra­das, to­do dia uma di­fe­ren­te, nun­ca me fi­xei em ne­nhu­ma.

Acho que, cer­ta­men­te, ten­ta­va com­pen­sar o tem­po per­di­do, a ausência de ca­ri­nho e de afe­to, os anos per­di­dos de mi­nha ado­lescência. Em­ba­lei nes­sa lou­cu­ra e nun­ca mais pa­rei. En­tre 18 e 30 anos de ida­de, tu­do o que fiz foi “cor­rer atrás do pre­juízo”.

Eu sa­bia, sem­pre sou­be, da existência da Aids. Ti­nha vis­to al­gu­mas pes­so­as mor­re­rem “dis­so”, com­ple­ta­men­te ex­cluídas do gru­po a que per­ten­ce­ram. Mas acha­va que era um pro­ble­ma dos ou­tros e que nun­ca acon­te­ce­ria co­mi­go, mas ti­nha também uma coi­sa que eu pen­sa­va: se “pe­gar, foda-se”. Foda-se.

Pois bem, acabei exatamente assim, fodido.

Mas an­tes de me da­nar, me di­ver­ti e fui fe­liz pa­cas (de cer­ta for­ma, ain­da sou!).Tro­ca­va de na­mo­ra­da to­do dia e, às ve­zes, mais de uma vez ao dia.

E para quem acha que eu estou contando “groselha”, o cara do camisão de cor estranha sou eu, numa versão 25 anos, quando cheguei à posição de radialista, com direito a Carteira de Imprensa. Neste vídeo, está uma pessoa a quem eu amei como a um pai e, de certa forma, ele foi isso para mim, me incutindo as bases dos conceitos de moral e de ética, responsabilidade e respeito, que eu só pude estabelecer verdadeiramente em minha vida, depois do diagnóstico por HIV.

Afastei-me dele no dia em que tive a certeza absoluta e irremediável que ele se envergonhava de mim, por eu assumir a minha condição de portador e HIV e, com base nisso, muita coisa que poderia ter sido feita para melhorar este trabalho não foi feita porque ele reza pela cartilha que ensina que os doentes representam o fracasso.

De al­gu­mas não lem­bro se­quer o ros­to. De ou­tras, guar­do, ao me­nos, o no­me. Mas exis­ti­ram al­gu­mas que mar­ca­ram mi­nha vi­da tan­to quan­to ela, o meu an­jo, de for­ma di­fe­ren­te, mas ir­re­tocável.

Si­mo­ne, Flávia, Débo­ra, Day­se, Cássia, Pau­la, Ana Cláudia, Clau­dia Vi­ei­ra, Lau­ra (um ca­so à par­te), Ra­quel, Po­ti­ra (índia mes­mo, lá do Xin­gu). A ca­da uma de­las amei ar­den­te­men­te e, creio, fui ama­do por elas tan­to quan­to po­de­ria ser ama­do um ho­mem que, se­gun­do elas mes­mas, ja­mais per­ten­ce­ria ape­nas a uma mu­lher.

Nem to­das par­ti­ram fe­li­zes. Al­gu­mas saíram de mi­nha vi­da em guer­ra co­mi­go e com a vi­da. Mas a vi­da e a guer­ra têm al­go em co­mum que não sei dis­so­ci­ar…

Mas hou­ve, em es­pe­ci­al, al­guém que se cha­ma­va Ga­bi…

Ah! Ga­bi… Que ou­tras não te sai­bam a existência. Que fi­que en­tre nós o que hou­ve en­tre nós.

Você, que me seqües­trou nu­ma ma­dru­ga­da pe­ri­go­sa, fez da mi­nha vi­da uma mon­ta­nha-rus­sa cheia de sur­pre­sas, ale­gri­as, trans­tor­nos, bei­jos, abraços, lu­zes de to­das as co­res e ma­ti­zes, si­nos de to­dos os tons…

Você que me amou e que par­tiu de re­pen­te co­mo no so­ne­to. Você, a quem amei co­mo nun­ca ama­ra an­tes e que me en­si­nou que não pos­suímos nin­guém, ape­nas di­vi­di­mos mo­men­tos e que sem­pre me foi fi­el e le­al, na me­di­da do que po­de­ria ter si­do le­al e fi­el, sem na­da co­brar, sem na­da exi­gir, que não fos­se com­pre­ensão, cum­pli­ci­da­de e ca­ri­nho. Fui seu cúmpli­ce, você foi mi­nha deu­sa, e ca­mi­nha­mos mui­to tem­po, la­do a la­do, com o olhar no ho­ri­zon­te, bus­can­do al­go que nun­ca sou­be­mos o que era…

So­fri um bo­ca­do quan­do você par­tiu, você sa­be, você lem­bra… mas tem aqui­lo… Se eu le­vo ain­da seu sa­bor, cer­ta­men­te le­varás sa­bor de mim…

Mas to­quei a vi­da pa­ra fren­te, pros­se­gui ou­vin­do meus dis­cos, ani­man­do meus bai­les, bei­jan­do mi­nhas ga­ro­tas, cur­tin­do a vi­da com os ami­gos, às ve­zes dia aden­tro, até qua­se meio-dia. Uma vi­da bem lou­ca, cheia de al­tos e bai­xos, amo­res e de­sa­mo­res, afe­tos e de­sa­fe­tos, cons­truções e ruínas. Mas fui me de­si­lu­din­do com a noi­te, que já não ofe­re­cia mais o que eu es­ta­va acos­tu­ma­do a es­pe­rar de­la. A noi­te mu­dou, dei­xou de ser uma coi­sa românti­ca e pas­sou a ser um comércio ba­nal de cor­pos e dro­gas. Is­so me en­tris­te­cia. Não era o que eu que­ria da vi­da. Tal­vez não te­nha si­do a noi­te que te­nha mu­da­do. Tal­vez te­nha si­do eu quem te­nha mu­da­do a ma­nei­ra de ver a noi­te.

E no meio do ca­mi­nho, em al­gum lu­gar, com tan­tos des­cui­dos, um vírus se ins­ta­lou em mim, si­len­ci­o­sa­men­te, e co­meçou seu tra­ba­lho. Eu na­da sa­bia.

A mi­nha in­sa­tis­fação com tu­do fa­zia com que eu qui­ses­se mu­dar de vi­da, que­ria uma ou­tra al­ter­na­ti­va e não con­se­guia en­con­trá-la.

Aos 30 anos, co­nhe­ci Si­mo­ne. Ela, uma mu­lher de ou­tro mun­do, le­van­ta­va às seis da ma­nhã e tra­ba­lha­va o dia in­tei­ro. Éra­mos o sol e a lua, eu era a lua… Era in­te­res­san­te acordá-la às seis da ma­nhã com mil gra­ce­jos e pi­a­das, fa­zen­do com que ela sor­ris­se lo­go ce­do e saísse, ani­ma­da, pa­ra o tra­ba­lho, até as seis da tar­de, quan­do eu a en­con­tra­va e pas­seáva­mos até a ho­ra de eu ir tra­ba­lhar.

Nes­ta ho­ra, ela em­bur­ra­va e di­zia: “Clau­dius, is­so não dá fu­tu­ro. Você pre­ci­sa mu­dar de vi­da”.

Foi ela quem me apre­sen­tou a es­ta en­ti­da­de, o com­pu­ta­dor, e me pas­sou os pri­mei­ros ru­di­men­tos da ar­te de usá-lo mes­mo sem com­pre­en­der. Foi o início da mu­dança, que se­ria gra­da­ti­va, pe­no­sa, difícil, mas que eu fa­ria, por amor. En­tre­tan­to, ela não te­ve a pa­ciência ne­cessária pa­ra es­pe­rar es­sa trans­for­mação e me dei­xou, nu­ma noi­te de sába­do, sem mai­o­res ex­pli­cações.

Tu­do o que res­tou foi a lem­brança de um ro­man­ce rápi­do, tórri­do, ma­lu­co, ar­den­te… Mar­cou-me pro­fun­da­men­te. Creio que amei es­sa mu­lher e, quan­do a per­di, fi­quei mui­to do­en­te, com de­pressão.

A princípio, di­ag­nos­ti­ca­ram gri­pe. Tra­tei co­mo gri­pe du­ran­te 28 di­as. Era uma me­nin­gi­te vi­ral. Dei en­tra­da no Hos­pi­tal Ban­dei­ran­tes en­tre a vi­da e a mor­te e per­ma­ne­ci in­ter­na­do um bom tem­po lá. A médi­ca, não me re­cor­do o no­me, pe­diu-me au­to­ri­zação pa­ra fa­zer o exa­me de HIV. Na­que­le es­ta­do, eu au­to­ri­za­ria qual­quer coi­sa e, quan­do acor­dei, no dia 13 de no­vem­bro de 1994, às 15h43 mim, o re­sul­ta­do es­pe­ra­va-me:

So­ro­po­si­ti­vo.

O mun­do de­sa­bou pa­ra mim. Des­co­bri, em se­gun­dos, que es­ta­va tu­do per­di­do, que em pou­cos di­as eu se­ca­ria co­mo uma plan­ta em um va­so sem água e mor­re­ria.

Ti­ve me­do, pâni­co e ter­ror. Na­da sa­bia so­bre a do­ença. Ape­nas que era fa­tal, que ma­ta­ria em pou­cos me­ses. Nun­ca ha­via me im­por­ta­do com as notíci­as so­bre a AIDS; na verdade, eu não sabia nada, era um pro­ble­ma dos ou­tros. Cho­rei e pen­sei em me ma­tar, mas achei que o míni­mo que po­dia se es­pe­rar de mim era o su­por­tar com co­ra­gem o que quer que es­ti­ves­se por vir.

As­sim, co­mo per­ce­bem, não me ma­tei. De­ci­di por es­pe­rar e agüen­tar as con­seqüênci­as de mi­nha ir­res­pon­sa­bi­li­da­de, de meus des­cui­dos. Era o míni­mo a fa­zer: su­por­tar com decência as con­seqüênci­as de meus des­cui­dos.

Lem­brei-me de que, pou­co an­tes, ti­ve uma na­mo­ra­da, que nun­ca usára­mos ca­mi­si­nha (a Si­mo­ne). Jul­guei que a ti­ves­se ma­ta­do, que era cul­pa mi­nha e só mi­nha. Não me pas­sou pe­la ca­beça que po­de­ria ter si­do ela quem me trans­mi­tiu a do­ença. Era uma hipóte­se palpável, mas eu não en­xer­ga­va is­so. Sa­bia que ti­nha de fa­lar com ela, avisá-la, dar a ela a opor­tu­ni­da­de de sa­ber e se pre­pa­rar co­mo fos­se me­lhor. Es­ta­va mui­to per­to do Na­tal e de­ci­di es­pe­rar que o ano aca­bas­se. Foi uma bar­ra duríssi­ma aguar­dar tan­to tem­po. Es­te fez questão de se ar­ras­tar. Eu sa­bia que ti­nha a obri­gação, o de­ver mo­ral de alertá-la pa­ra que ti­ves­se as mes­mas opor­tu­ni­da­des que eu de se tra­tar e lu­tar pe­la vi­da. Mas ha­via o me­do da reação de­la, do que eu ou­vi­ria de­la, uma pes­soa tão que­ri­da, tão ama­da. De­pois des­sas da­tas fes­ti­vas, não ti­ve co­ra­gem de fa­lar. A ca­da dia in­ven­ta­va uma no­va des­cul­pa pa­ra mim mes­mo e pro­te­la­va pa­ra ama­nhã. Um ami­go, um que­ri­do ami­go, fez is­so por mim, aten­den­do a um pe­di­do meu. Dis­se-me que se ar­re­pen­deu no exa­to se­gun­do em que re­ve­lou a ela o que se pas­sa­va co­mi­go, que foi difícil acalmá-la e mantê-la no ei­xo. Mas fez os exa­mes e de­ram re­sul­ta­dos ne­ga­ti­vos, re­pe­ti­das ve­zes.

Foi pa­ra mim um gran­de alívio sa­ber que não trans­mi­ti pa­ra ela o vírus. Acho que não te­ria su­por­ta­do es­sa cul­pa. Ela su­miu, pre­fe­riu me ig­no­rar e es­que­cer. Tu­do o que fez, des­de então, foi me es­cre­ver uma car­ta, na qual di­zia que guar­da­ria pa­ra sem­pre, com ca­ri­nho, os di­as e as noi­tes que passára­mos jun­tos… Pa­ciência. Men­ci­o­nou também a in­tenção de do­ar uma ces­ta bási­ca to­do mês pa­ra a ca­sa de apoio em que pas­sei a vi­ver. Ao di­a­bo com ela e com a ces­ta bási­ca. Do­eu mui­to is­so, mas ho­je já pas­sou, tu­do pas­sa até a in­di­fe­rença.

Por não ter con­se­gui­do ja­mais man­ter uma re­lação estável, des­co­bri-me só, sem ami­gos, sem nin­guém que me apoi­as­se por não ter nin­guém que re­al­men­te me amas­se e os que me ama­vam não sa­bi­am. Eu es­con­dia por me­do e ver­go­nha.

Stop Stigma red sign with sun background

No­vas Per­das

Per­di meu em­pre­go, per­di mi­nha ca­sa… Na ver­da­de, um quar­to de ho­tel, na Rua Au­ro­ra. Fui aban­do­na­do pe­los su­pos­tos ami­gos que ti­nha. As­sim é a vi­da. Não te­nho mui­ta cer­te­za se pos­so con­fi­ar em pes­so­as. Elas são co­mo ca­ta­ven­tos e mu­dam com o tem­po. E es­te é im­pre­visível.

Fui vi­ver em ca­sas de apoio, nas ru­as, e ba­ti mui­to a ca­beça por aí. Mas o tem­po pas­sou e eu não mor­ri. Não se­quei co­mo uma plan­ta em um va­so sem água. Des­co­bri que a vi­da era possível mes­mo com o HIV, e que portá-lo não sig­ni­fi­ca­va uma sen­tença de mor­te. De­ci­di, então, lu­tar por mi­nha vi­da, por mi­nha dig­ni­da­de de ser hu­ma­no.

Nes­se período, en­tre tan­tas coi­sas, além de meu au­to­jul­ga­men­to, no qual fui um juiz im­pi­e­do­so, um acu­sa­dor te­naz e um fra­co de­fen­sor, con­si­de­rei-me res­ponsável por mui­tas coi­sas e, no de­cor­rer do pro­ces­so, le­vei mi­nha mãe ao tri­bu­nal de mi­nha cons­ciência, amar­ra­da e amor­daçada, olhei pa­ra ela, en­chi-me de pi­e­da­de e de­ci­di-me por per­doá-la.

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Mas per­do­ar men­tal­men­te não bas­ta­va, era pre­ci­so le­var es­te perdão até ela de uma ma­nei­ra ou de ou­tra. Era ne­cessário en­con­trá-la, achá-la, abraçá-la e dei­xar o pas­sa­do so­ter­ra­do nas arei­as que tu­do con­so­mem…

Foi uma lon­ga e di­li­gen­te bus­ca. Sou hábil em en­con­trar coi­sas e pes­so­as su­pos­ta­men­te per­di­das. (A úni­ca fa­lha foi não en­con­trar Fáti­ma, mas acre­di­to que ela não quei­ra ser en­con­tra­da, su­miu sem dei­xar vestígi­os.) Coi­sa que apren­di na noi­te, nas ru­as, na vi­da…

O Re­en­con­tro com a Mãe

Quan­do achei mi­nha mãe, três anos atrás, en­con­trei uma mu­lher en­ve­lhe­ci­da, tor­tu­ra­da pe­lo tem­po e pe­lo re­mor­so, agar­ra­da a um Deus que ela não co­nhe­ce, di­la­ce­ra­da por um câncer que ela não tra­tou e lhe to­mou os símbo­los de sua ma­ter­ni­da­de (…). (A jus­tiça faz-se, quei­ra­mos ou não, e se faz sem­pre no pon­to exa­to em que fa­lha­mos, nos apon­tan­do a exa­ta fa­lha de nos­so caráter. Bas­ta que olhe­mos pa­ra nós mes­mos e sa­be­re­mos on­de es­ta­mos er­ran­do…)

Con­ver­sa­mos mui­to. Per­ce­bi que ela es­ta­va per­den­do o pou­co que lhe res­ta­va de sa­ni­da­de men­tal, ape­gan­do-se a fan­tas­mas, ilusões e ar­re­pen­di­men­tos tar­di­os, mas de al­ta mon­ta.

Nun­ca me vi tão api­e­da­do de al­guém. E não sei até on­de o meu ódio de ou­tros anos po­de ter ge­ra­do ener­gi­as ruins que a te­nham pre­ju­di­ca­do de for­ma tão in­ten­sa.

Mas pi­e­da­de não é amor. E ar­re­pen­di­men­to tar­dio também não o é. E é jus­ta­men­te o amor que con­duz o na­vio.

De uma ma­nei­ra ou de ou­tra que­brou-se o víncu­lo de amor que nos unia e, pen­so eu, ja­mais será re­a­ta­do…

Até por­que não há mais tem­po.

O câncer que a di­la­ce­rou e que ela fez questão de não tra­tar por­que o Se­nhor a cu­ra­ria (Ele cu­ra, mas não dis­pen­sa o em­pe­nho de médi­cos e o sa­crifício da qui­mi­o­te­ra­pia) es­pa­lhou-se e está con­su­min­do o que lhe res­ta de vi­da, se é que já não aca­bou com tu­do.

Na últi­ma vez que a vi, es­ta­va mal e in­di­fe­ren­te a mim. Não pro­cu­rei sa­ber mais na­da. É o con­cei­to da re­ci­pro­ci­da­de ali­a­do à cons­ciência de que te­nho de me bas­tar a mim mes­mo.

Des­de o di­agnósti­co po­si­ti­vo, sen­tia um imen­so des­pre­zo por mim mes­mo e pe­la vi­da que ha­via vi­vi­do até então. De­ci­di re­co­meçar. Pro­cu­rei apren­der um pou­co mais so­bre in­formáti­ca pa­ra po­der ter mei­os de sub­sistência (de­vo is­so à Si­mo­ne). Apren­di o bas­tan­te pa­ra po­der mon­tar as máqui­nas que uso e, de vez em quan­do, fa­zer al­gu­ma ma­nu­tenção e ar­ran­jar al­guns tro­ca­dos. Ho­je já faço até al­guns si­tes… Não dá mui­to, mas vou le­van­do. Te­nho pro­je­tos mai­o­res, mas me fal­tam re­cur­sos.

En­quan­to vi­via na ca­sa de apoio, acha­va que ia en­lou­que­cer pe­la ausência de pers­pec­ti­va de vi­da, pe­la fal­ta de um ho­ri­zon­te, pe­la carência de uma es­pe­rança. As ca­sas de apoio cum­prem um de­ter­mi­na­do pa­pel so­ci­al, mas não era is­so o que eu pro­cu­ra­va. Não que­ria um lu­gar pa­ra es­pe­rar a mor­te che­gar, que­ria lu­tar pe­la mi­nha vi­da, na am­pli­tu­de do que com­pre­en­do co­mo vi­da.

De re­pen­te, tu­do mu­dou, qua­se ca­su­al­men­te. Ha­via um no­vo pa­ci­en­te na ca­sa de apoio, o Wal­dir, mui­to de­bi­li­ta­do, que pre­ci­sa­va ir ao Hos­pi­tal Dia di­a­ri­a­men­te. Não ha­via quem o acom­pa­nhas­se e me per­gun­ta­ram se eu fa­ria is­so.

Dis­se que sim. Afi­nal, era uma opor­tu­ni­da­de de ser útil e uma pos­si­bi­li­da­de a mais de sair, ver o mun­do, pes­so­as, cla­re­ar meus pen­sa­men­tos.

Era uma ro­ti­na re­la­ti­va­men­te sim­ples: de ma­nhã, eu lhe da­va um ba­nho, lim­pa­va su­as es­ca­ras (ti­ve de apren­der mui­to so­bre a fra­gi­li­da­de hu­ma­na e re­co­nhe­cer que po­de­ria ser eu no lu­gar de­le, al­gum dia…), fa­zia os cu­ra­ti­vos con­for­me me en­si­na­ra a en­fer­mei­ra e o en­ca­mi­nha­va, pas­so após pas­so, pa­ra a am­bulância, co­nhe­ci­da co­mo “pa­pa tu­do”, uma iro­nia sem li­mi­tes…

Che­gan­do ao hos­pi­tal, co­lo­ca­va-o nu­ma ca­dei­ra de ro­das e le­va­va-o ao ter­cei­ro an­dar, on­de era co­lo­ca­do num lei­to e re­ce­bia me­di­cação en­do­ve­no­sa. Fi­ca­va lá, as­sim, o dia in­tei­ro.

Eu não sa­bia o que ele ti­nha, mas era al­go terrível, pois ele mal se sus­ten­ta­va so­bre su­as per­nas. Pre­ci­sa de apoio pa­ra ir ao ba­nhei­ro, pa­ra co­mer, pa­ra tu­do… Até um co­po com água ele não era ca­paz de se­gu­rar. Mes­mo as­sim en­con­trei tem­po pa­ra co­nhe­cer os ou­tros pa­ci­en­tes da­que­le an­dar e fui, na me­di­da do possível, fa­zen­do ami­za­des, co­nhe­cen­do aque­las pes­so­as, su­as históri­as, fa­zen­do de­las, mi­nha família. Ga­nhei até mes­mo a con­fi­ança dos médi­cos e dos en­fer­mei­ros que pas­sa­ram a ver em mim um aju­dan­te, al­guém a mais pa­ra co­la­bo­rar.

Bus­ca­va ca­dei­ra de ro­das, em­pur­ra­va ma­cas, fa­zia tu­do aqui­lo que po­de­ria pa­ra aju­dar.

Tra­zia água pa­ra um pa­ci­en­te, aler­ta­va en­fer­mei­ras so­bre o so­ro que aca­ba­ra, a veia que se per­de­ra, apren­di mui­to so­bre a ro­ti­na de um hos­pi­tal e de­vo is­so a ca­da uma das pes­so­as que ti­ve o pri­vilégio de ser­vir.

No­vos Estímu­los

Mas foi nes­te período que apren­di a va­lo­ri­zar não ape­nas a vi­da, mas o mun­do em si. O mun­do ga­nhou som Dolby Sur­round e co­res em Te­ch­ni­co­lor. Ca­da pes­soa que via, mes­mo um es­tra­nho, me pa­re­cia por de­mais im­por­tan­te pa­ra que eu pu­des­se ig­norá-lo. Um pássa­ro que des­se um pio era um si­nal de que eu es­ta­va vi­vo e que po­dia ou­vi-lo. A vi­da tor­nou-se sa­gra­da pa­ra mim, im­por­tan­te de­mais pa­ra que se pu­des­se ser des­per­diçada. Ca­da dia, ca­da se­gun­do ga­nhou uma im­portância ca­pi­tal em mi­nha ma­nei­ra de per­ce­ber as coi­sas. Es­ta­va re­nas­cen­do, um par­to di­fe­ren­te, em que um adul­to no­vo sai de den­tro de um adul­to ve­lho, co­mo uma bor­bo­le­ta que sal­ta de um ca­su­lo, com es­forço hercúleo, bus­can­do o ca­lor do Sol pa­ra lhe dis­ten­der as asas e alçar os vôos que lhe ca­bem. Mui­to do que re­a­pren­di da vi­da, o fiz den­tro de um hos­pi­tal, on­de se lu­ta­va pe­la vi­da a ca­da ins­tan­te e nem sem­pre se po­dia ven­cer. Amar não pe­lo me­do da mor­te, mas pe­la im­portância da vi­da, que é o que te­mos de mais sa­gra­do, o dom da vi­da, que sem­pre en­con­tra uma al­ter­na­ti­va, se você lhe dá uma opor­tu­ni­da­de. As­sim, re­sol­vi dar to­das as chan­ces possíveis à vi­da, e ela tem me da­do to­dos os re­tor­nos que me de­mons­tro ca­paz de re­ce­ber.

Mas vol­te­mos às pes­so­as. Den­tre os que lá co­nhe­ci, ha­via uma moça cha­ma­da Mércia que, se­gun­do con­ta­vam, ha­via che­ga­do ao estágio ter­mi­nal da do­ença e ti­nha con­se­gui­do vol­tar (…). Eram os efei­tos da te­ra­pia com­bi­na­da que co­meçavam a sal­var al­gu­mas vi­das.

Mércia con­traiu o HIV do ma­ri­do e foi co­lhi­da de sur­pre­sa por um di­agnósti­co po­si­ti­vo de HIV em vir­tu­de de um sem-núme­ro de in­fecções opor­tu­nis­tas que ata­ca­ram e ma­ta­ram seu ma­ri­do em período de cin­co me­ses. Ela também não es­ta­va le­gal.

Eu me per­gun­to sem­pre co­mo uma pes­soa co­meça a fi­car do­en­te dis­so ou da­qui­lo e nin­guém se in­co­mo­da em fa­zer um exa­me mais apro­fun­da­do; per­gun­to-me também co­mo a pes­soa não per­ce­be que al­go está er­ra­do e dei­xa ir até o fim, ao “deus-dará”… De­ve ser o me­do de sa­ber, mas não es­tar ci­en­te não sig­ni­fi­ca que o pro­ble­ma não exis­ta. E se há uma di­fi­cul­da­de, o me­lhor é en­frentá-la de fren­te, de pre­ferência em seu ter­ritório.

Mas quan­do co­nhe­ci Mércia, ela es­ta­va me­lhor, já ti­nha vol­ta­do a an­dar co­mo uma pa­ti­nha cho­ca. Eu sem­pre di­zia is­so pa­ra ela, que sor­ria… E es­ta­va re­ple­ta de es­pe­ranças, pen­sa­va em um re­co­meço.

Porém ti­nha de es­tar lá to­do dia e re­ce­ber me­di­cação en­do­ve­no­sa. As pi­ca­das a tor­tu­ra­vam, não ha­via mais veia que pu­des­se ser acha­da sem uma bus­ca de 30, 50 mi­nu­tos. E ela cho­ra­va só de ver a agu­lha. Acho que is­so pi­o­ra­va ain­da mais a si­tuação de su­as vei­as. Eu sem­pre pas­sa­va por ali às oi­to e meia da ma­nhã pa­ra ten­tar aju­dar. Abraçava-a e fi­ca­va fa­lan­do bes­tei­ras no ou­vi­do de­la. Pas­sa­va can­ta­das ca­be­lu­das na me­ni­na de 37 anos, e ela ria co­mo uma cri­ança. Ao me­nos se dis­traía, e a da­na­da da agu­lha en­tra­va, le­van­do vi­da, im­pro­vi­san­do so­bre­vivência.

Is­so du­rou uns dois me­ses, e ela te­ve al­ta.

Nes­te meio tem­po, o Wal­dir foi pi­o­ran­do a ca­da dia. Mas não me lem­bro de ter vis­to ou ou­vi­do uma úni­ca re­cla­mação, uma úni­ca lágri­ma de dor, na­da. Uma dig­ni­da­de ino­minável, uma co­ra­gem, pa­ra mim, com­ple­ta­men­te des­co­nhe­ci­da.

De­pois de tan­to tra­ba­lho com o Wal­dir, ga­nhei um fim de se­ma­na co­mo pre­sen­te. Pu­de re­ver al­gu­mas pes­so­as a quem eu ain­da amo, as­su­min­do o com­pro­mis­so de vol­tar na se­gun­da-fei­ra. Con­fes­so que foi um alívio. Es­ta­va can­sa­do de ver dor, so­fri­men­to, angústia e me sen­tir im­po­ten­te. Foi um fim de se­ma­na em que eu de­ve­ria ter re­la­xa­do. Mas não con­se­gui. Pen­sa­va no Wal­dir a to­do mo­men­to.

Será que o estão ali­men­tan­do? Será que de­ram ba­nho ne­le? Será que ele está bem cui­da­do? Será que ele jul­ga que eu o aban­do­nei?

Será?

Será?

Era um mar de per­gun­tas e, na se­gun­da-fei­ra, de­sa­bei na ca­sa de apoio, pro­cu­ran­do por ele.

Um sor­ri­so cíni­co pro­ve­ni­en­te de ou­tro pa­ci­en­te e a no­ti­fi­cação:

“Wal­dir está nas últi­mas. Nós até já re­par­ti­mos as coi­sas de­les. Aqui é as­sim…”.

Dis­pa­rei pa­ra o hos­pi­tal, quar­to an­dar, en­trei pra­ti­ca­men­te à força. Que­ria vê-lo, di­zer al­gu­mas pa­la­vras, dar-lhe um abraço, pe­dir perdão por al­gum er­ro que ti­ves­se co­me­ti­do… Um aper­to de mão, qual­quer coi­sa que pu­des­se se­lar nos­sa ami­za­de no mo­men­to de sua par­ti­da.

O qua­dro que vi era ater­ra­dor e com­pre­en­di ime­di­a­ta­men­te o porquê de ten­ta­rem me im­pe­dir de vê-lo.

Wal­dir já não re­co­nhe­cia na­da, não me via. Olha­va em vol­ta de si co­mo se vis­se ou­tras pes­so­as, ou­tras coi­sas… Den­tro do no­vo con­tex­to que se apro­xi­ma­va de­le, eu na­da sig­ni­fi­ca­va.

Saí do quar­to em silêncio, olhos úmi­dos, co­ração en­du­re­ci­do, ma­go­a­do co­mi­go mes­mo e com a vi­da. Eu am­bi­ci­o­na­va elevá-lo a um pa­ta­mar me­lhor, no qual pu­des­se des­fru­tar mais e me­lhor o dom da vi­da. Con­si­de­ra­va que a mi­nha “fol­ga” o ma­ta­ra.

Sen­tei-me na sa­la de es­pe­ra e aguar­dei a no­ti­fi­cação. Pas­sa­ram-se mais de 19 ho­ras an­tes que aqui­lo aca­bas­se e ele pu­des­se, fi­nal­men­te, re­pou­sar.

Li­guei pa­ra a ad­mi­nis­tração da ca­sa de apoio que me pe­diu que cui­das­se (sic) do fu­ne­ral.

Nun­ca ti­nha eu li­da­do com a mor­te tão de per­to. Papéis, do­cu­men­tos, ates­ta­dos, autópsi­as.

Tu­ber­cu­lo­se mi­li­ar (dis­se­mi­na­da por to­do o cor­po), se­gun­do me ex­pli­ca­ram. Is­so ma­tou o Wal­dir.

De­pois de três di­as, o cor­po de­le foi li­be­ra­do, num caixão de pa­pelão, pin­ta­do de pre­to, frágil co­mo a própria vi­da, da­que­les bem ba­ra­tos, e fo­mos nós, o mo­to­ris­ta, o Wal­dir e eu, em di­reção à Vi­la For­mo­sa, on­de ele se­ria dei­xa­do. Lem­bro-me de que a ex­pressão do ros­to de­le era de se­re­ni­da­de, pois o vi bem, an­tes de fe­char o caixão…

Não ha­via quem me aju­das­se a car­re­gar o caixão até o túmu­lo. O mo­to­ris­ta se re­cu­sou. De­pois de mui­to im­plo­rar, con­se­gui que três pes­so­as, que par­ti­ci­pa­vam de ou­tro fu­ne­ral, me au­xi­li­as­sem nes­te, que era meu últi­mo ser­viço pres­ta­do ao Wal­dir.

Não pu­de, por­que não ti­nha um tostão, plan­tar uma flor na­que­le túmu­lo, que nem sei on­de fi­ca…

sunset mountain road

De vol­ta pa­ra as Ru­as

Vol­tei pa­ra a ca­sa de apoio e cho­rei. Era só o que me res­ta­va…

Sen­ti, de­fi­ni­ti­va­men­te, que ali não era meu lu­gar, não ca­bia a mi­nha pes­soa den­tro de um lo­cal da­que­les. Pro­cu­rei ou­tra ca­sa de apoio e, no­va­men­te, não me adap­tei. Pre­fe­ri as ru­as, on­de tu­do é mais difícil, mas pe­lo me­nos po­de­ria de­ter­mi­nar os ru­mos de mi­nha vi­da. Fui ca­tar la­tas, pa­pelão, gar­ra­fas e fa­zer al­gum di­nhei­ro. Era uma guer­ra. Tra­ba­lhei co­mo ca­melô, ven­di bi­chi­nhos vir­tu­ais, re­fri­ge­ran­tes, tu­do e qual­quer coi­sa. Mui­tas ve­zes ten­do de de­fen­der meu di­rei­to ao tra­ba­lho na ba­se dos so­cos e pon­tapés, só pa­ra va­ri­ar… Re­fiz mi­nha vi­da aos pou­cos…

Às ve­zes, o di­nhei­ro que eu ga­nha­va me dei­xa­va uma es­co­lha: Co­mer ou dor­mir?

Op­ta­va por dor­mir num dia e co­mer no ou­tro, se a sor­te fos­se me­lhor. Mas fui me ca­pi­ta­li­zan­do, cres­cen­do, me re­fa­zen­do, sem pâni­cos, mas com al­gu­ma in­cer­te­za.

Me­ses de­pois de sair da ca­sa de apoio, en­trei no CR­TA pa­ra cui­dar de mim mes­mo e vim des­cen­do os oi­to an­da­res pe­las es­ca­das. Fui até o al­to do prédio, por­que que­ria ter a opor­tu­ni­da­de de en­con­trar o mai­or núme­ro possível de pes­so­as co­nhe­ci­das. Pas­san­do por to­dos os quar­tos, aca­bei re­en­con­tran­do Mércia, que dor­mi­ta­va, de olhos aber­tos, bas­tan­te aba­ti­da, tão aba­ti­da que me as­sus­tei. Ela também se as­sus­tou com a che­ga­da re­pen­ti­na de uma pes­soa e acor­dou.

Não ha­via mui­to a di­zer. Eu per­ce­bia cla­ra­men­te que era o fim, já ti­nha apren­di­do a iden­ti­fi­car a mor­te em an­da­men­to. E ela me dis­se as­sim:

— Cláu­dio, es­tou can­sa­da. Não que­ro mais vi­ver. Já não agüen­to mais tu­do is­so.

Mes­mo sem es­pe­rança, ra­lhei com ela e dis­se que vi­ves­se, que lu­tas­se, que não ce­des­se ago­ra que es­ta­va tão per­to (do quê?!), que se­guis­se só mais um dia, que ela vi­ves­se um dia por vez.

Ela me dis­se que vi­nha vi­ven­do um dia por vez há mui­to tem­po, e que de­pois dis­so pas­sou a vi­ver uma ho­ra por vez, ago­ra con­ta­va os mi­nu­tos…

Fi­quei com ela o quan­to pu­de, mas ti­nha que ir em­bo­ra. Era uma sex­ta-fei­ra, e a vi­da me cha­ma­va lá fo­ra, me co­bran­do obri­gações e com­pro­mis­sos…

Quan­do eu fa­lei que ia em­bo­ra, ela me abraçou e agra­de­ceu:

— Obri­ga­da por tu­do, Cláudio

Cho­rei, co­mo cho­ro ago­ra, e não ti­ve pa­la­vra… Foi a últi­ma vez que a vi em vi­da na Ter­ra. Fa­le­ceu em ca­sa, jun­to aos seus, que se sen­ti­ram de cer­ta for­ma ali­vi­a­dos(…).

Fui to­can­do a vi­da co­mo pu­de, tra­ba­lhan­do co­mo era possível, co­nhe­cen­do o pre­con­cei­to de per­to e sen­tin­do co­mo sua lâmi­na é afi­a­da e cru­el, insidiosa e pérfida.

Em­pre­go? Nem pen­sar. Nin­guém em­pre­ga uma pes­soa que fal­ta ao tra­ba­lho uma vez ao mês. Vou me vi­ran­do.

Ca­sei-me com uma moça, ado­ra­da por mim, que não ti­nha o vírus e não o tem até ho­je. Sem­pre que tran­sa­mos, usa­mos ca­mi­si­nha. Sa­be­mos que nos­sas vi­das são mais im­por­tan­tes que a ausência do látex, pro­cu­ra­mos nos res­pei­tar e nos amar.

Pa­ra per­ma­ne­cer vi­vo e saudável, si­go à ris­ca as pres­crições de meus me­di­ca­men­tos, re­gu­lar­men­te, de tan­tas em tan­tas ho­ras, to­dos os di­as. É uma bar­ra. Difícil de con­tro­lar, mas es­sen­ci­al. Uso agen­da, com­pu­ta­dor e ami­gos, além de mi­nha ama­da es­po­sa pa­ra não per­der os horári­os. Vou ad­mi­nis­tran­do os remédi­os co­mo quem ad­mi­nis­tra o oxigênio num sub­ma­ri­no afun­da­do.

Ho­je man­te­nho meu si­te (www.so­ro­po­si­ti­vo.org), en­quan­to es­pe­ro pe­la cu­ra ou por ou­tra coi­sa, se­ja o que for, até mes­mo um pa­trocínio. Te­nho ob­je­ti­vos, que­ro aju­dar a mu­dar es­te qua­dro de dis­cri­mi­nação e, se não pu­der fa­zer tu­do so­zi­nho, ao me­nos po­de­rei lançar as ba­ses de um mo­do mais dig­no de vi­ver pa­ra os por­ta­do­res de HIV.

Es­tou reu­nin­do pes­so­as em vol­ta de mim. Não de mim, mas de mi­nhas idéias, que vão se es­pa­lhar de­va­gar e sem­pre, até que se­ja uma on­da in­con­trolável.

Tal­vez eu não vi­va pa­ra ver is­so. Mas não im­por­ta es­te pon­to.

O mais im­por­tan­te é que as­sim co­mo eu, ou­tras pes­so­as têm uma história pa­re­ci­da com a mi­nha e estão vi­vas. Não sou um mi­la­gre, não sou uma ex­ceção.

A vi­da é sem­pre possível, mes­mo com o HIV.

É pre­ci­so que as pes­so­as se cons­ci­en­ti­zem dis­so.

Es­ta­mos vi­vos e que­re­mos con­ti­nu­ar vi­vos.

So­mos che­fes de família, ar­ri­mos de famíli­as, res­ponsáveis por nos­sos des­ti­nos.

Te­mos as mes­mas obri­gações que to­das as ou­tras pes­so­as. É bas­tan­te co­e­ren­te que te­nha­mos as mes­mas opor­tu­ni­da­des. Não é jus­to que se­ja­mos ex­cluídos da vi­da ape­nas por es­tar­mos do­en­tes e por ter­mos de nos tra­tar pe­ri­o­di­ca­men­te.

So­mos dig­nos de res­pei­to co­mo se­res hu­ma­nos que so­mos.

So­mos dig­nos de amor co­mo qual­quer ou­tra pes­soa.

E, so­bre­tu­do, so­mos dig­nos da vi­da.

Não se so­li­da­ri­ze co­mi­go. So­li­da­ri­ze-se com o mun­do que é seu também.

Clau­dio S.S. — Web­mas­ter, 38 anos – Um Soropositivo desde os 30anos — Pi­ra­ci­ca­ba/SP

Texto publicado no Livro histórias de coragem, da da Editora Madras, que é uma coletânea com 14 depoimentos de pessoas vivendo com HIV ou AIDS. Cada texto foi comentado por uma pessoa da mídia, formadora de opinião e quem comentou o meu textos foi o Repórter Marcos Uchoa
e-mail: so­ro­po­si­ti­voweb­si­te@gmail.com

Preditores de neuropatia periférica relacionada ao HIV na era moderna

Comentário

A primeira coisa que me ocorreu fazer depois de ler o texto do Cláudio foi lê-lo para meus três filhos. Não como um alerta “Cuida­do com a AIDS! ”, a consciência do perigo dessa doença poderia ser prematura para eles, que afinal são crianças, embora importante ain­da assim.

No entanto, acho que o que Cláudio fez foi escrever sobre coi­sas que nos tocam bem mais do que a Aids. Usando as palavras dele, somos “um juiz impiedoso, um acusador tenaz, um fraco defensor…” do outro, raramente de nós mesmos. Tanta paixão ao atacar, tão pou­ca compaixão ao defender…

E nos encosta numa parede moral.

Faz de certa forma a pergunta: Você que quer ajudar? Quer mesmo? Qualquer pessoa, de qualquer forma, pode fazer uma dife­rença no mundo, se quiser. Depois de ler o que o Cláudio escreveu, meio envergonhado, meio entusiasmado, pensei: Eu quero.

Marcos Uchoa Jornalista

PS. A pessoa a quem eu me referia como minha amada esposa, cujo nome não grafei antes e não grafarei agora, era uma espécie de demônio particular que eu tinha, que chegou ao ponto supremo de dizer: “Que doencinha de merda esta que você tem”!.

Sei que, depois da publicação do livro tive um entrever qualquer com ela, posto que eu não pusera o nome dela no livro (vaidade das vaidades, é tudo vaidade) e, algum tempo depois, não mais suportando o mal humor dela, nua manhã de sábado eu acordei e, vendo-a de costas, sentada à mesa, fazendo seu desjejum, desejei-lhe bom dia duas vezes e ela me respondeu assim:

“Como posso ter um bom dia se a primeira pessoa que eu vejo é você?”

Agarrei a oportunidade como o esquilo agarra a avelã:

Não se preocupe então pois em pouco mais de uma semana eu já terei deixado esta casa…

e ela: Vai embora assim? Não vai esperar nem o natal.

Eu disse que eu e minha doencinha não aguentávamos mais ver a cara dela, num regime de reciprocidade em que o mais urgente era desfazer o casal e foi assim que, um semana depois, eu já estava estabelecido, mal e porcamente, em São Paulo… o resto, é vida que corre e vocês só saberão quando sair meu  livro, memórias de um homem da noite

Aqui eu encontrei algo a acrescentar. Uma musica do Queen chamada Spread your wings. Foi meu primeiro esforço em traduzir uma coisa e, olhando para ela, agora, aqui em 2016, parece que eu traduzi, sem perceber, a minha própria profecia…

HOSPITAL DAS CLÍNICAS DA FACULDADE DE MEDICINA DA UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO

DIVISÃO DE MOLÉSTIAS INFECCIOSAS E PARASITÁRIAS

SERVIÇO IE EXTENSÃO

Rua Ferreira de Araújo, 789 Pinheiros

São Paulo -SP  É 11-30**-1***

LAUDO MÉDICO

Oe acordo com o que preceitua o Código de Ética Médica, nos termos da legislação vigente e de conformidade com o pedido formulado pelo interessado, declaro que o Sr Claudio Santos de Souza, matricula no serviço sob registro RG3256664J, está em acompanhamento regular com seguintes diagnósticos/ClD•10 até o presente momento:

#HlV/Aids diagnóstico em 11/1994 / 18:24}

#Candidíase oral 1996 {B20.4)

#lnfecção latente tuberculosa tratada com Isoniazida em 1997 (Z20A}

#Arritmia cardiaca: bloqueio parcial ramo O/bradicardia sinusal por antidepressivos triciclicos em 2006 (149-9/qoo,1}

#0epressão (F321 Dislipidemia (E78.5j Diabetes fE14,} Obesidade IE66,)

#PO tardio de gastroplastia redutora {técnica Capella 10/2011) #Embolia Pulmonar 1126.} em 2011 + hipertensão pulmonar

#HAS {110) controlada após cirurgia bariátrica Catarata {H26,9)

#5ífilis (A51.O) gonorréia herpes genital IABO} Litíase vesicular (K80,5}

#Trombose venosa profunda/tromboftebite MMII de repetição {182.9}: 2008, 2009 e 2010 #intervenção cirúrgica em 21/01/2013: de herniorrafia incisional abdominal, apendicectomia, colecistectomia.

*Herpes zoster ramo oftálmico 04/2015 fB02)

Neuropatia periférica em membros superiores e inferiores (G62,9), acarretando fraqueza muscular, parestesias e doreS, medicado e em seguimento pela equipe de dor

#Angioma cavernoso cerebelar em seguimento com neurologia

Tratamento: TDF±3TC+ATVr, ezetirnibe, alopurinol, AAS, atorvastatina, enoxaparina, clomipramina, risperidona, zolpidem, clorpromazina, flunitrazepam, gabapentina, amitriptilina, metadona

últimos exames; CD4=107D (08/03/2016) e Carga viralH cópias/mm i (29/08/2016)

São Paulo, 02/02/2017

Dra Angela N *rna / CRM 7*****Resultados dos Exames

 

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3 comments

Joaquim Augusto 25 de março de 2016 - 22:32

Uma história dura, tal qual a realidade da vida que se esquecemos que é dura, ela dá um jeito de nos lembrar. Vou aguardar o livro porque uma coisa que não lhe falta é talento e certamente deve ter muitas histórias pra contar. Histórias tristes, histórias alegres, histórias que mostram que a vida tem valor e devemos lutar por ela, mesmo nos momentos mais difíceis.

Reply
Cláudio S. Souza 25 de março de 2016 - 23:01

Sim, é uma história dura. Msa teve lá seus momento de regozijo e alegria. Fique em paz

Reply
rafa 23 de março de 2016 - 18:00

Por favor, vamos fazer doações a este site, que ajuda a muitos sem cobrar nada em troca.
Se você melhorou ao ler algo aqui, retribua para que ele se mantenha e outras pessoas possam ser bem acolhidas.

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Sempre disse: Há vida com HIV, mas aprendi uma nova: Hey, você aí… Não desista! Resista, persista e insista, a resiliência é fruto cotidiano da labuta diária!

 

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